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Title: Por onde anda a virtude?

Writer: Fernanda Pivano

Translator: Mariarosaria Fabris

Information about the work

  • Type: Obra Literária
  • Classification: Tradução; Romance ou novela
  • Publication year: 2002
  • Publisher: Berlendis e Vertecchia, São Paulo, SP
  • Languages: Português
  • Original title: Dov'è più la virtù
  • Complete translation of the work(s)
  • Language(s) of the translated work: Italiano
  • Medium: Impresso
  • ISBN: 8586387436
  • Number of pages: 239
  • Dimension: 14x21 cm

Source(s)

  • Projeto Dicionário Bibliográfico da Literatura Italiana Traduzida

Description

Coleção Letras Italianas. Lombardia.

Retrato em nanquim de Fernanda Pivano no frontispício.

Fierce

As múltiplas facetas de Fernanda Pivano


Por Mariarosaria Fabris

junho/2025


⠀⠀⠀Fernanda Pivano nasceu em 1917 e faleceu em 2009. Natural de Gênova, destacou-se como tradutora e divulgadora de obras da literatura norte-americana contemporânea, a partir da versão em italiano de Spoon River Anthology, (1915), uma coleção de poemas de Edgar Lee Masters. Lançada pela editora Einaudi de Turim em 1943 (edição parcial, sob o título de Antologia di S. River, na vã tentativa de driblar a censura fascista, aludindo a um “santo rio”) e reeditada em 1947 (edição completa), a Antologia di Spoon River veio à luz, graças ao empenho do escritor Cesare Pavese, seu ex-professor de italiano na capital piemontesa, para onde a família Pivano havia se mudado em 1929 e onde ela se formou em Letras, em 1941, e em Filosofia, em 1943. Sua tesi di laurea intitulou-se Moby Dick, di Herman Melville e, embora o autor fosse norte-americano, na página de rosto está registrado que a tese era de literatura inglesa.  


⠀⠀⠀Foi Pavese quem a introduziu à literatura norte-americana quando, em 1938, além da citada antologia de Lee Masters, apresentou-lhe Leaves of Grass (Folhas de Relva, 1855), de Walt Whitman,  A Story Tellerʼs Story (1924), memórias de Sheerwood Anderson, cuja tradução ela publicará em 1947 sob o título de Storia di Me e dei Miei Racconti, e A Farewell to Arms (Adeus às Armas, 1929), de Ernest Hemingway. Censurada pelo Fascismo, Addio alle Armi provocou a detenção da jovem Fernanda pelos nazistas. Posta em liberdade, depois de um longo interrogatório, o incidente despertou a curiosidade de Hemingway, quando os dois se encontraram em Cortina d’Ampezzo (outubro de 1948), o qual, embora já circulassem duas versões em italiano de sua obra (1945 e 1946) determinou que a única tradução oficial seria a de Fernanda Pivano, que foi publicada em 1949, pela editora Mondadori de Milão.   


⠀⠀⠀Graças a seu mentor, ela também foi seduzida pelo mito da América que havia começado a formar-se nos anos 1920 e imperou na década seguinte, atraindo intelectuais italianos que passaram a interessar-se pelas obras literárias de autores como James M. Cain, Erskine Caldwell, John dos Passos, William Faulkner, Ernest Hemingway, John Steinbeck, dentre muitos outros, que simbolizavam a descoberta de uma nova ordem social em oposição ao regime vigente na Itália. Interesse atestado por obras como America Primo Amore (1935), de Mario Soldati, America Amara (1938), de Emilio Cecchi, Il Sangue d’Europa: Scritti Politici e Letterari (1939-1943), de Giaime Pintor e, principalmente, Americana (1942), antologia organizada por Elio Vittorini, e La Letteratura Americana e Altri Saggi (1951), em que foram reunidos postumamente ensaios produzidos entre 1930 e 1950 por Cesare Pavese, dentre os quais “Ritorno all’Uomo” (1945), em que ele havia afirmado: “Naturalmente, não podiam admitir que buscássemos na América, na Rússia, na China ou em outro lugar um calor humano que a Itália oficial não nos dava. Muito menos, que buscássemos, simplesmente nós mesmos. E, no entanto, foi isso, Lá longe, buscamos e achamos nós mesmos. Das páginas duras e bizarras daqueles romances, das imagens daqueles filmes, chegou-nos a primeira certeza de que a desordem, o estado violento, a inquietude de nossa adolescência e de toda a sociedade que nos rodeava, podiam resolver-se e aplacar-se num estilo, numa ordem nova, podiam e deviam transfigurar-se numa nova lenda do homem” (1978, pp. 211-212).


⠀⠀⠀Em 29 de outubro de 1949, a tradutora casou-se com o arquiteto e designer de vanguarda Ettore Sottsass Jr. – depois de ter recusado dois pedidos de casamento de seu mentor (em 1940 e em 1945) – , e mudou-se para Milão, onde viveu até 1972, quando foi para Roma. Seu casamento com Sottsass havia entrado em crise em 1971, mas os dois divorciaram só em 1990. Em 1983, ela voltou definitivamente para Milão.

         

⠀⠀⠀Em 1956, Fernanda Pivano foi, pela primeira vez, ver de perto aquela terra do outro lado do Atlântico que os intelectuais da geração anterior haviam conhecido por intermediação cultural. Apaixonada pelo país,  passou a estudar e a traduzir vários autores norte-americanos, dentre os quais Francis Scott Fitzgerald, William Faulkner, John Dos Passos, Norman Mailer, Saul Bellow, os da chamada Beat Generation – Allen Ginsberg, Jack Kerouac, William Burroughs, Lawrence Ferlinghetti, Neal Cassady, Gregory Corso –, além de Henry Miller, Charles Bukowski e, posteriormente, Erica Jong, Jay McInerney e Bret Easton Ellis.


⠀⠀⠀Dentre sua vasta produção como crítica e ensaista, podem ser arrolados: Lo Zio Tom è Morto (1947: na época, recusado pelas editoras e publicado apenas em 2015), La Balena Bianca e Altri Miti (1961), America Rossa e Nera (1964), Poesia degli Ultimi Americani (1964), Le Belle Ragazze (1965), L’Altra America negli Anni Sessanta (1971), Cronache del Nuovo Sesso (1972), Beat Hippie Yippie (1972), Mostri degli Anni Venti (1976), C’era una Volta un Beat (1976), Intervista a Bukowski (1982), Hemingway (1985, biografia), Amici Scrittori (1995), Altri Amici, Altri Scrittori (1997), Album Americano: dalla Generazione Perduta agli Scrittori della Realtà Virtuale (1997), Viaggio Americano (1997), Dreamers: la Generazione che ha Cambiato l'America (1998), Dopo Hemingway: Libri, Arte ed Emozioni d'America (2000), Un po' di Emozioni (2002), The Beat Goes on (2004), I Miei Amici Cantautori (2005); Pagine Americane (2005), Lo Scrittore Americano e la Ragazza Perbene: Storia di un Amore: Nelson Algren e Simone de Beauvoir (2007). Entre 2008 e 2010 foram publicados seus diários: Diari 1971-1973 e Diari 1974-2009.


⠀⠀⠀Como ficcionista, Fernanda Pivano escreveu Cos’è più la virtù (Por onde anda a virtude?, 1986), um “romance quase de amor”, constituído por trinta e uma histórias e um epílogo, em que, nos casos contados pela protagonista é possível detectar dados autobiográficos da autora; e La mia kasbah (1988), inspirado em sua temporada romana, em que uma ex-aeromoça conta histórias das tribos que circulavam pelo bairro de Trastevere, dentre as quais se destacam aquelas protagonizadas por mulheres.  


⠀⠀⠀Em julho de 1986, numa livraria de Nápoles, seu livro de estreia chamou minha atenção e aguçou minha curiosidade. Diante de uma autora com tamanha bagagem intelectual, com traduções e ensaios de sua autoria circulando pela minha casa, tudo me levou a apostar numa boa leitura. Minhas expectativas, no entanto, não se confirmaram. Nem por isso deixei de sugerir sua tradução à editora Berlendis & Vertecchia, na medida em que a trajetória interior da protagonista não sendo exemplar, não deveria ser imitada, embora isso nem sempre corresponda à realidade, pois nas relações amorosas, no fundo, no fundo, pouca coisa mudou.


⠀⠀⠀Nos vários casos em que se envolve com homens que nem sempre lhe interessam, sua “heroína romântica” se coloca sempre como presa, uma presa que se entrega ao jogo da sedução para, na hora “H”, resistir, preservando sua virtude, fiel à educação recebida pelas mulheres de sua geração que eram parceiras de um homem só. Por ser tão dependente do olhar masculino para existir, embora fosse uma mulher intelectualizada e financeiramente independente, no prefácio ao livro, dei a essa heroína anônima o nome de Amélia, como no samba de Ataulfo Alves, porque, sem ser uma mulher do lar, sempre almejou ser “mulher de verdade”, no sentido que ela sempre foi ou quis ser o que os homens determinaram que é uma mulher de verdade.


⠀⠀⠀Por isso, apesar do longo e árduo caminho percorrido pela protagonista e pela autora num universo masculino e frequentemente misógino, em Por onde anda a virtude?, “Amélia ainda mora aqui” (título que dei ao prefácio). Porque a verdadeira transgressão deveria ter sido a fidelidade a si mesma, por suas escolhas, e não uma pseudoadequação a modelos comportamentais cristalizados.


 Referências

PIVANO, Fernanda. Por onde anda a virtude. Trad. Mariarosaria Fabris. São Paulo: Berlendis & Vertecchia, 2002.

PAVESE, Cesare. “Ritorno all’Uomo”. In: La Letteratura Americana e Altri Saggi. Turim: Einaudi, 1978, pp. 211-212.

Reference

PIVANO, Fernanda. Por onde anda a virtude?. Translation from Mariarosaria Fabris. São Paulo, SP: Berlendis e Vertecchia, 2002. ISBN: 8586387436.


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